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Direito de Família e Mobilidade Internacional

Ação de Reconhecimento de Sentença Estrangeira

Reconhecimento de Sentença Estrangeira

Com a globalização, torna-se necessário entender que uma família transnacional, com membros de diferentes nacionalidades, que mantém residência fora do seu país de origem, ou possui residência em mais de um país, precisa se preocupar com o reconhecimento de decisões judiciais que envolvam questões importantes. Uma delas, é o reconhecimento de sentenças que devam ser cumpridas em qualquer dos países envolvidos.

Dentre as decisões mais importantes, estão: sentenças que decretam divórcios, partilha de bens, pensão de alimentos, guarda de filhos, adoção, e outras consideradas importantes no âmbito de cada família.

O reconhecimento dessas sentenças ocorre através de uma ação judicial de revisão e confirmação de sentença estrangeira, cujo nome se aproveita tanto no Brasil, quanto em Portugal.

No Brasil, esta ação é realizada no Superior Tribunal de Justiça (STJ), cujo reconhecimento será proferido por um desembargador após a verificação de que a sentença estrageira está apta a produzir efeitos no Brasil após preencher os requisitos legais, não sendo verificadas ofensas à ordem pública do Estado brasileiro. 

Em Portugal, esta ação é realizada no Tribunal da Relação, cujo reconhecimento será proferido por um desembargador após a verificação de que a sentença estrageira está apta a produzir efeitos em Portugal, ou seja, que preenche os requisitos de reconhecimento e não ofende à ordem pública do Estado português.

O RECONHECIMENTO DE SENTENÇAS DE GUARDA E ALIMENTOS

Para os pais transnacionais (separados/divorciados), com mais de uma nacionalidade, e que vivam em países distintos, é importante que os países envolvidos na vida desta família estejam cientes das decisões judiciais que as envolvem. Isso se faz necessário para evitar conflitos judiciais em âmbito internacional.

Ex de caso prático: O pai mora em Portugal e a mãe no Brasil com os filhos.

Decisão proferida no Brasil: Guarda compartilhada de responsabilidades parentais, porém com o lar de referência das crianças com a mãe no Brasil + alimentos de X em moeda real brasileiro + visitas no Brasil e férias com o pai em Portugal.

Conclusão jurídica: Para Portugal, trata-se de uma sentença estrangeira que deve ser reconhecida pelo tribunal português, a fim de evitar conflitos judiciais em âmbito internacional.

Ex. de conflito: Situação das crianças que se encontram de férias com o pai em Portugal não serem devolvidas à mãe no Brasil. Nesse caso, se a sentença estiver reconhecida em ambos os países, o Estado português deverá garantir os meios de devolução das crianças nos termos da sentença brasileira; o que poderia não acontecer sem o reconhecimento desta sentença, uma vez que o tribunal português poderia ser provocado a decidir de forma contrária, na ausência de revisão e confirmação da decisão brasileira.

É claro que o caso acima não é tão simples quanto parece, e poderia se desdobrar em uma série de conflitos internacionais, mas a citação básica já é suficiente para que os (pro)genitores tomem conhecimento da importância dessa questão legal.

Por fim, é de se destacar que a sentença pode ser reconhecida de forma parcial, a depender da divergência existente no entendimento dos Tribunais, o que por si só, já vale a consulta de um especialista.

O RECONHECIMENTO DE SENTENÇAS DE ADOÇÃO DE FILHOS MENORES EM PORTUGAL

A lei da nacionalidade portuguesa dispõe que o adotado por cidadão português adquire a nacionalidade portuguesa. Em tese, essa é a única exigência.

Mas na prática, para que a nacionalidade portuguesa seja atribuída ao filho menor adotado, se faz necessário a confirmação e o reconhecimento da sentença estrangeira de adoção pelo Tribunal da Relação português.

Sendo assim, qualquer cidadão português que adotar uma criança no exterior, deve realizar uma ação de reconhecimento de sentença estrangeira no Tribunal da Relação português para garantir seu efeito legal.

É preciso também, que esse reconhecimento seja realizado na menoridade, em razão de ainda se encontrar em discussão a inconstitucionalidade do art. 14º da lei da nacionalidade portuguesa:

Art. 14º “Efeitos do estabelecimento da filiação
Só a filiação estabelecida durante a menoridade produz efeitos relativamente à nacionalidade.”

Somente após o reconhecimento da sentença estrangeira de adoção, a criança será reconhecida como filho(a) de um(a) cidadão(ã) português(a), estando apta a adquirir a nacionalidade portuguesa, e a gozar de direitos e garantias legais em Portugal nos termos do art. 5º a Lei nº37/81 e arts. 16 e 17 do Decreto-Lei nº 26/2022.

O RECONHECIMENTO DE SENTENÇAS DE ADOÇÃO DE FILHOS MENORES NO BRASIL

A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art. 12, dispõe quem são os brasileiros natos:

Art. 12, inciso I, alínea “c”, “são brasileiros natos os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira” (grifos nossos) 

Isso quer dizer que os filhos de brasileiros nascidos no exterior podem adquirir a nacionalidade brasileira através de declaração de vontade após completarem a maioridade, desde que já tenham adquirido essa condição de forma provisória com o registro de nascimento em repartição consular.

Recentemente, esse dispositivo gerou controvérsia, quando filhos adotivos de uma cidadã brasileira, nascidos no exterior, fizeram o requerimento de nacionalidade originária em um dos cartórios de registo civil de um estado brasileiro, após completarem a maioridade.

Embora a constituição brasileira não faça distinção entre filhos biológicos e adotivos, o pedido foi negado por não haver previsão constitucional para que seja concedida a condição de brasileiros natos aos filhos adotivos de brasileiros, que tenham nascido no exterior.

Em razão desse requerimento, atualmente aguarda-se no Brasil, o julgamento pelo STF sobre a questão de ausência de previsão constitucional para filhos adotivos requererem a nacionalidade originária nos termos do art. 12, I, c, da Constituição.

Ministros já concluíram, por unanimidade, que esta questão tem repercussão geral, ou seja, gera impacto social, e em razão disso, a Corte vai analisar se a Constituição permite a concessão da condição de brasileiro nato a quem tem o vínculo pela adoção.

Apesar dessa discussão um tanto discriminatória, na prática, já existem acórdãos recentes proferidos a favor dos filhos adotivos sob o fundamento do princípio da igualdade entre filhos biológicos e adotivos. Confira aqui um julgamento realizado em outubro de 2022 pela 4ª Turma do TRF4, onde o colegiado determinou, por unanimidade, a homologação da opção pela nacionalidade originária brasileira feita por uma requerente nascida no exterior, que foi adotada por mãe brasileira, é maior de 18 anos e reside no Brasil.

O RECONHECIMENTO DE SENTENÇAS DE DIVÓRCIOS

Portugal:

O reconhecimento de sentenças judiciais e escrituras públicas de divórcio são realizadas no Tribunal da Relação, através da ação judicial de reconhecimento de sentença estrangeira. Para os divórcios realizados em países da união europeia, não há a obrigatoriedade de uma ação judicial, podendo ser reconhecido diretamente nas Conservatórias do Registo Civil. Clique aqui e baixe o e-book explicativo.

Brasil:

Para que a sentença estrangeira que decretou o divórcio de um brasileiro tenha validade jurídica no Brasil, é preciso submetê-la ao reconhecimento do Superior Tribunal de Justiça, ou, realizar o registro desta no Cartório de Registro Civil, a depender do caso.

O Código de Processo Civil dispõe: “a sentença estrangeira de divórcio consensual produz efeitos no Brasil, independentemente de homologação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ)”, mas os efeitos somente serão produzidos no caso de divórcios consensuais.

O artigo 1º do Provimento nº 53/2016 do CNJ dispõe que “a averbação direta no assento de casamento da sentença estrangeira de divórcio consensual simples ou puro, bem como da decisão não judicial de divórcio, que pela lei brasileira tem natureza jurisdicional, deverá ser realizada perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais a partir de 18 de março de 2016.”, ressalvados os casos em que houver além da dissolução do casamento, decisão sobre a guarda de filhos, alimentos e/ou partilha de bens. Neste caso, dependerá de reconhecimento pelo STJ.

EFEITOS DO NÃO RECONHECIMENTO DA SENTENÇA DE DIVÓRCIO

A omissão da atualização do estado civil em um dos países em que a(o) cidadã(o) possui nacionalidade, pode acarretar uma série de consequências legais, inclusive em âmbito criminal.

Para a aquisição de um imóvel no país em que não reconheceu o divórcio realizado no exterior, por exemplo, dependerá da(o) ex-cônjuge para a realização do contrato, a depender do regime de bens.

Para a realização de novo casamento, a dissolução do anterior precisa ter sido reconhecida.

Esses são só alguns exemplos do embaraço a que o cidadão(ã) pode se submeter com a omissão do estado civil em um dos países em que possuir nacionalidade.

É NECESSÁRIO A REPRESENTAÇÃO POR ADVOGADO?

SIM. A representação por advogado(a) se faz necessário para o processo de reconhecimento judicial tanto no Brasil, quanto em Portugal.

A análise da sentença, a orientação quanto aos documentos necessários, bem como a sua preparação (formato correto e tradução certificada), dependerão da análise de especialistas com inscrição nas Ordens dos Advogados do Brasil e de Portugal.

Priscilla Sant’Anna.